sexta-feira, 12 de junho de 2009

Sobre café e moedas de um centavo

"A cobertura que se forma sobre o café é para conservar a bebida".
A frase estava escrita em letra desenhada a giz na pequena lousa verde, que no colégio eu conhecia como 'O Quadro Negro'".
O lugar de destaque em que o aviso estava na cafeteria roubou minha atenção antes de qualquer coisa. Não era o número do Procon, nem as informações das promoções do dia, nem mesmo uma saudação canastrona de boasvindas. Se estivesse numa galeria até poderia ser um trecho de poema pósmoderno, mas era pouco provável que se tratasse de uma instalação naquela cafeteria desconhecida.
Estava claro, era uma frase de caráter informativo, utilitário, não pude deixar de pensar:
- Que diabos quer dizer isso?
Percorri sôfrego os olhos pelo balcão, avistei a máquina Italiana, olhei para as prateleiras, por cima dos ombros da carrancuda atendente, com seus potes e conteúdos. Tudo em vão. Nenhum sinal de nada que justificasse a placa.
Primeiro, procurei pelos grãos da bebida depositado em algum recipiente com a misteriosa cobertura sobre a qual era necessário informar a toda e qualquer pessoa que detivesse os olhos por um momento no estabelecimento. Sem sucesso, passei a me perguntar se tudo aquilo não se referia aquela espuma que fica sobre o café quando sai da máquina, mas aquilo seria um disparate e o ar pouco amigável da minha interlocutora do balcão me desencorajou a perguntar. Mesmo assim insisti.
- Que frase é essa no quadro?
- É um aviso, senhor.
- Hum. Mas...
- O que o senhor deseja?
O tom impaciente não camuflou o: "Diga o que quer e caia fora".
- Eu... - Ora, me diga o que você faria? Eu queria um café, mas de repente, não eram mais só os bons pretinhos de sempre, eu não poderia tomar aquilo, seja lá o que fosse. Que cobertura era aquela? Por que tinha uma placa? Por que o uniforme da mulher não estava branco? E, Deus, por que o segurança estava parado atrás de mim?
- E então?
- ... Eu queria um pão francês. - Consegui vomitar.
- Com manteiga?
- Não! - Respondi assustado. - Por favor, só-o-pão-francês.
Ela me olhava desconfiada enquanto o segurança andava à paisana. Prontamente ela jogou o pão morto no saquinho de papel e disparou:
- 29 centavos.
- Aqui.
Minha história terminaria aqui, juro, mas a sádica não estava satisfeita com todo sofrimento que me causara.
- O que mais?
- O meu um centavo.
- Não temos um centavo.
- Mas você disse 29 centavos. Eu concordei em pagar 29 centavos, não 30 e nem 31. Quero meu um centavo.
O homem de preto já estava atrás de mim quando decidir elevar o tom de voz.
Ela suspirou enfastiada em jogou desdém cinco centavos sobre o balcão e me deu as costas. Eu não me lembro se foram os impropérios que ela revidou ou a presença pouco amistosa do sujeito tão perto de mim, mas em algum momento, tudo que eu conseguia ver era o o rosto aterrorizado da mulher, enquanto me arrastavam para fora entre gritos distantes: "Eu quero um centavo! É meu direito! Eu quero meu um centavo.... Me soltem! Eu jamais beberia essa coisa que vocês servem ai! O que é aquela placa? O que é..."

2 comentários:

john disse...

rsrsrsr
nossa muito legal, o típico "enigma de dom quixote". Após ler seu divertido texto me veio à cabeça, que é realmente comum nos depararmos com enigmas aparentemente banais, mas que nos acompanham de forma assustadora ao longo de horas, dias e as vezes até mesmo anos. fico feliz de saber que n sou o unico louco nesse mundão de meu Deus.
muito bom mesmo
abraços

Anônimo disse...

Excellent !!!
Denni